Palavras novas e velhas

sábado, 18 de dezembro de 2010

Socialismo ou barbárie (retruque a "Chega a barbárie")

 Marx acreditou durante bem tempo que o proletariado como sujeito histórico revolucionário está "predestinado"  a fazer a revoluçom e tomar o poder, numha clara concesom ao idealismo hegeliano em que se formou. Tivo que entrar em contacto com Feuerbach para mudar isto. Kroportkine achava que a revoluçom social era inminente e que a revoluçom comunista só podia ser libertária e nom a do comunismo autoritário. Fosse como for esta revoluçom sempre é colectiva e parte da auto-organizaçom dos trabalhadores para atingir o poder e logo destruí-lo, mais ou menos gradualmente-. Lenine promulgou a organizaçom no partido-guia, que tantos destroços causou mutando cidadaos em súbditos - isso sim, "proletários" da boca para fora dos pés à cabeça-, e atacou o esquerdismo do terrorismo individual anarquista... Páginas e páginas se tenhem elaborado sobre a violência e a acçom transformadora colectiva e individual. Porén se algo é acertado verdadeiramente para a actual conjuntura histórica é  o que exprime Marx e que andado o tempo relançará Rosa Luxemburgo: "socialismo ou barbárie" que é aceitar que o capitalismo nom cairá por si próprio nem é inevitável essa revoluçom proletária que ponha fim à sociedade de classes. Pode chegar a destruiçom total, a barbárie... o caos.

E todo isto bem a conto de que lim hoje um texto do que gostei e que me fixo reflexionar um bocadinho sobre as cousas do mundo. Som essas boas reflexons que impelem aos demais também a reflexionar. Um artigo que recomendo ler porque dá para pensar, ainda que no tempo dos consumidores consumidos sejamos poucos os moços que nos entretemos e "perdemos o tempo" com estas lérias. Como o que tinha que dizer ao respeito era bastante, permito-me esta forma de comentário alongado para comentar a entrada do meu amigo Jorge Pérez. Vaia por diante que só comentarei aqueles aspectos em que a minha postura é divergente ou aspectos que evocou o texto do Jorge em mim e sobre os que sentia necessidade de reflexionar, porque já os tinha falado também com algum outro companheiro.

A ideia de que toda mulher ou home é um luitador para mim entronca com o roussianismo e aquela teoria de que o home era bom natureza e que foi do gosto de parte do socialismo utópico e da moral que deslitam parte dos contributos de Proudhom. No entanto, essa ideia renje, porque podemos aceitar que qualquer pessoa é um luitador em "potência" contra o sistema e qualquer pessoa o é em "acto" nalgumha altura da sua vida, mas em cousas tam trivais como, por exemplo, negar-se a consumir um produto com o que o bombardeiam no Natal ou qualquer outro acto de resistência. Porém isso som bagatelas, e se renúncia a umha efectiva transformaçom da realidade a utopia muda em retrocesso e o poder que se pretende eliminar entrega-se de balde aos que já o detectam. Por isso se produzira na II República o apoio da  CNT à Frente Popular nas eleiçons de fevereiro de 1936 ou por isso aparecera o Partido Sindicalista que decidiu advogar por um anarquismo político-institucional. Do mesmo jeito, no partido bolxevique Lenine tivo que confrontar-se com os otzovistas, cujas teses fôrom derrotada em junho de 1909. Os otzovistas defendiam que os bolxeviques deviam sair da Duma e deixar de fazer actividade parlamentar. Precisamente o líder desta facçom qualificada por Lenine de "esquerdista" (veja-se A doença infantil do comunismo), Alexander Bogdanov, formara-se no anarquismo individualista no grupo Narodnaia Volya (A vontade do povo), antes de passar-se ao POSDR. Todo home e toda mulher podem ser artistas se se transforma o seu horizonte de expectativas social, mas nom o som por natureza, cumpre adquirir um saber-fazer através da auto-organizaçom da classe trabalhadora.

Para mim há infinitas formas de luitas, mas só as organizadas (e aqui nom penso em aparatos políticos) coerentemente orientadas e obstinadamente voltadas para a transformaçom do entorno social acotio som as efectivamente antissistema. O outro podem ser resistências esporádicas que nom fam mais que reproduzir as contradiçons lógicas entre capital e trabalho.Por dizê-lo com outras palavras: ressistir-se ao direito à greve nos controladores num aeroporto enquanto se fica passivo perante os recortes sociais que afectam e afectarám a esses cidadaos vale de bem pouco; partir-lhe os fozinhos ao ex-ministro de Fazenda grego  - se for ilhadamente- nom vale para nada, paralisar o país reiteradamente e muito mais efectivo. Concordo com Antoni Domènech quando fai o seguinte asserto (o negrito é meu): 

A história das utopias modernas mostra que estas costumam aparecer em momentos catastróficos, de derrota. Sem ir mais longe, a Utopia de Tomás Moro é em boa medida uma reacção ao desastre da conquista de América: Rafael Hytlodeo é um português que lhe conta a Moro o felizes que viviam os índios até a chegada dos invasores. Ademais, o primeiro livro da Utopia de Moro analisa com muito detalhe a catástrofe que supôs a destruição dos bens comuns na Inglaterra de começos do século XVI. Do mesmo modo, o chamado "socialismo utópico" é uma reacção à contrarrevolución, à catástrofe política que supôs para os movimentos populares a derrota de Robespierre. Precisamente, a eclosión do socialismo não utópico, o marxismo e o anarquismo, se produz quando o movimento operário retoma a iniciativa. Em ocasiões, as utopias podem propor reflexões interessantes, críticas e lúcidas, como é o caso de William Morris ou Diderot, mas com freqüência resultam muito reaccionarias. Por suposto, não há nada mais despótico que a República de Platón. Mas também, apesar do que com freqüência se diz, Tomás Moro era profundamente conservador. Em Utopia tinha escravos públicos, muitos deles emigrantes pobres que se esclavizan voluntariamente, um patrioterismo feroz... Em geral, a utopia associa-se a uma derrota mau aceitada, a uma fugida da realidade que tem um componente autoritario. As utopias costumam estar mais preocupadas pela harmonia e a felicidade que pela liberdade, ao invés que os movimentos revolucionários reais.
 Na utopia ultraliberal (e vimo-lo agora que petam na porta de papá-estado e na crise desamalhoada por estas loucas teorias) a multitude, a massa, já nom é povo ou o "proletariado" convertido em categoria-fetiche que conduze umha vanguarda desde arriba (quando só se pode ser vanguarda abaixo, na base, e na acçom no meio social, ou seja na sociedade civil)*. A massa som os consumidores, os clientes... numha argamassa ideológica do pós-modernismo e a pós-política para perpetuar a hegemonia e ocultar os trabalhadores e a luita de classe. Porém a subjectividade da classe trabalhadora, entendida como o desenvolvimento da consciência de classe, nom é um gesto individual de risco e violência, mas o produto do trabalho colectivo e das luitas colectivas.

Isto, portanto, associa-se com Rousseau e o boísmo, associa-se com a rebeliom contra a razom que operou na filosofia política e que conduziu a concepçom romántica do povo como massa conduzida polas classes dominantes. E em conduzir está o verbo latino DUCO relacionado com Duce, a denominaçom que recebia Mussolini. O condutor do rabanho quando a irracionalidade passa por cima da razom e o indivíduo se perde num colectivo onde só se respeita a individualidade duns poucos - os que realmente movem os fios-.

Liga-se entom com a dicotomia entre a razom da Ilustraçom -e do socialismo científico dele pairido (for anarquismo, for comunismo). e o irracionalismo do Modernismo. Nom por acaso esta revolta contra a razom se associa com o nacionalismo e o romantismo. Em Fitche estám sentadas as bases do nacional-socialismo ao passar da filosofia para a política. No nacionalismo de Fitche opom-se o individualismo extremo de "o universo som eu" - parafraseando a Luis XIV- para rematar dando umha visom boista do povo anónimo e para situar o povo alemám na cima. Um darwinismo social que opom o home nobre ao home inobre que nom deve ter lugar na Humanidade.A cima do moviemento irracional na filosofia é Nietzche - nom por acaso do gosto dos pós-modernos como Derridá, Foucault ou Deluze-. Ainda que Nietzche, a diferença do nazismo nom era antissemita nem nacionalista, aplica o darwinismo social entre os indivíduos quando fala de impedir a reproduçom dos desadaptados.

A fascinaçom pola violência nom é algo novo e tem sido sempre própria do "esquerdismo". Um dos grandes pensadores da esquerda actual como Slavoj Zizek foi sometido a umha esmagadora crítica por Paul Kellog na resenha que publicou sobre o livro Revolution at the Gates: A Selection of Writtings from February to October 1917 [pode ler-se no número sete em papel de Sin Permiso]. O "ultraesquerdismo" ou "esquerdismo" noutras versons foi definido por Lenine em A doença infantil do comunismo como as teorias e as práticas políticas que parecem muito de esquerda e muito mais radicais das que defendem os que luitam pola democracia socialista e os direitos dos cidadaos, mas que na prática som altamente conservadoras (mantemo-nos ao margem na estética e no exercício da "violência redentora", como Zizek lhe chama, renunciando a transformaçom efectiva e real da sociedade em que deixam a pele, e por vezes até a vida milhons de pessoas. Dito doutro modo, gramscianamente, renunciamos à subversom da hegemonia imperante, acçom necessariamente colectiva, ou bem porque actuamos só individualmente ou bem porque nos negamos a somar forças na diferença (por exemplo os que nom vam nem fam greve por mor do seu descontento com os sindicatos quando estes som a ferramenta histórica dos trabalhadores para atingir melhoras e tender para a correlaçom de forças através da luita de classes).

O termo "violencia redentora" nasce curiosamente na teologia, da mao de Walter Wink que a critica como mito fundacional da "sociedade de domínio" associando-a à antiga mitologia babilónica: "Típicamente un dios celeste masculino de la guerra libra una batalla decisiva contra una divinidad feminina, normalmente mostrada como un mostruo o dragón que reside en el mar o en un abismo (el elemento feminino)". Na tradiçom grega, mas próxima a nós, coido que esse papel joga-o fundamentalmente Gea. "Haciendo de la violencia algo placentero, fascinante y entretenido, el poder es capaz de engañar a la gente y hacerla dócil con un sistema que les está engañando hasta en sus propias vidas". Um gramsciano reconhece aqui a crítica a um aspecto da superestrutura ideológica através da que o capitalismo exerce a sua hegemonia, mas Zizek longe disso perde-se desenvolvendo umha noçom de "violência redentora" como um projecto contra-hegemónico, mas nom como um projecto hegemónico (alternativa ao capitalismo).

Wink engade que "habiendo derrotado al enemigo original mediante la guerra y el asesinato, el vencedor crea un mundo a partir del cadáver del monstruo. El orden cósmico requiere la supresión de la violencia de lo femenino, y se espeja en el orden social con la sujeción de las mujeres a los hombres y del pueblo a sus gobernantes". O filme O clube da luita, muito do gosto de Zizek, serve-lhe para desenvolver a sua noçom de "violência redentora" através de Norton, personagem da pequena burguesia ("classe média professional") que é permeável ao individualismo extremo (vejam-se muitos postulados do Tea Party e a sua composiçom "popular"). Eis também a personagem do romance de Mário Vargas Llosa que cita o Jorge. Nas versons radicais deste individualismo tende-se a gabar a violência individual, como o único modo de ressistir à sociedade capitalista, porque a perspectiva de classe da pequena burguesia, na que me incluo, está divorciada do trabalho colectivo diário e das luitas dos oprimidos. Afasta-se entom do potencial da acçom colectiva da classe trabalhadora refugiando-se no individual toda vez que atingir a hegemonia e mudar o horizonte de expectativas social semelha impossível.

O sindicalista George Sorel em Reflexons sobre a violência mostra fascinaçom pola acçom e a violência, a qual longe de ser beneficiosa para a esquerda serviu de base à extrema direita como confessou Mussolini: "a quem mais lhe devo é a Sorel. Este mestre do sindicalismo, com as suas cruas teorias das tácticas revolucionárias, contribuiu em grande medida para a forma da disciplina, a energia e o poder das greas fascistas". Assim em Zizek a violênvia mostra-se como um fim em si própria quando nom era assim em Lenine, onde era um instrumento, o direito dos oprimidos a recorrer à violência para a sua própria defesa perante o monopólio da violência física e simbólica do Estado. Lenine di que "sem a classe trabalhadora todas as bombas som impotentes (...). Umha chamada a recorrer a semelhantes actos terroristas, como a organizaçom de atentados contra a vida de ministros por parte de grupos e indivíduos que nom som conhececidos mais alá dos uns dos outros, de modo que nom irrompem apenas nas massas, mas que também insirem umha desorganizaçom completa nesse trabalho". Isto é comum com o grosso do anarquismo, daí a acçom organizada da CNT e a sua implantaçom no corpo social da II República.

No fundo, e recapitulando, a celebraçom de Zizek da "violência redentora" e individual reflecte, antes de mais, um profundo pessismismo na política de massas. Como apostilha Kellog "es ésta una característica habitual de todas las celebraciones individuales de la violencia, algo que según Lenin las hacía muy similares, a pesar de su retórica de izquierdas, a las de aquellos cuyos horizontes está limitados por la lucha parlamentaria por las reformas. (...) Tanto el reformista parlamentario como el terrorista 'evaden el papel centra de cómo los trabajadores, por sí mismos, transformaría una sociedad... Una tendencia sustituyó con el terror a la lucha de masas; la otra, con la reforma, a la revolución... y ninguna de las dos contempló la auto-organización de la clase trabajadora como un palanca para el cambio revolucionário' ".

Aguardo ter sentado assertos e bases para continuar com este debate, para mim bastante importante. Nem que dizer tem que nem de longe penso que o irmao Jorge tenha nada a ver com as conseqüências  aqui expostas dalguns elementos que ele expunha no seu artigo. Porém trata-se de confrontar culturas políticas e formaçons um bocado diferentes e de avançar colectivamente através do diálogo na area pública. Aguardo, aliás, que outras vozes estejam dispostas a incorporar-se a este debate. Passem sem chamar.

* Em qualquer revoluçom ou auto-organizaçom dos trabalhadores operam alianças de classes como a que se estabeleceu em Rússia entre o campesinhado, os intelectuas e o proletariado. Perder isto de vista por parte de representantes tam sólidos da esquerda radical nom resignada dá boa conta do actual nível de confussom intelectual.


quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

O Plano Bolonha e a greve na universidade



Os estudantado da USC fazendo fincapé numha esquecida unidade convocou para o 16 de dezembro de 2010, manhá entom, umha greve geral em que se imbricam sindicatos -como Comités, Agir ou o Sindicato de Estudantes- com assembleias como as de Medicina ou História, algumhas com umha trajectória bem conhecida outras criadas ex nihilo praticamente neste curso. Um companheiro meu lembrava como o êxito dos protestos da  LOU se cimentárom desde a generosidade e por cima das siglas e um outro que se derruírom quando se tentou capitalizar e usurpar a participaçom colectiva para fins espúreos. Eu mesmo  sempre acreditei em que este era o caminho, esperemos podemos ir tirando liçons e armá-la como se merece...

Esta greve chega inserida no mal-estar que gerou a extinçom de matérias nos alunos das licenciaturas e dentro dum Processo de Bolonha contestado polo sindicalismo (nom ao completo pois IESGA aderiu ao processo) privatizador da universidade. Isto último tenta-se que seja enganche para os alunos do grao com problemas já denunciados em cursos anteriores como o máster de secundária.

No Velho Continente Sílvio Berlusconni vem de degragar mais um bocado a "democracia" com a compra de parlamentares que lhe permitírom superar a recente moçom de censura. Arde, no entanto, Roma sob as fortíssimas pressons originadas polas revoltas do estudantado que reactivárom a todo o centro-esquerda, assim como os jovens desplomárom a popularidade de Sarkozy polos protestos contra a reforma das aposentadorias.

Por enquanto Europa treme pola acçom do estudantado - face a passividade geral- em Grécia os jovens levam a iniciativa nos contínuos protestos contra os recortes do Governo social-liberal de Papandreu. No Reino Unido os protestos do estudantado conseguírom a queda livre na intençom de voto dos liberais , que se afundiu de 23% nas eleiçons de maio até 8% no último inquérito de YouGov. Isto deve-se a que os liberais prometêrom na campanha eleitoral que se oporiam à suba das taxas e que um grande caladoiro de votos para o partido de Nick Clegg foi a universidade.

A suba das taxas em Inglaterra é um prelúdio do que acontecerá no Reino de Espanha de continuarem as medidas junguidas à doutrina ultraliberal inspiradora do Plano Bolonha. Só os reitores, que verám inçados os ingressos para os seus centros, parecem estar satisfeitos com a suba das taxas que passarám de 3.900€ para 10.700€. Porém, isto só afecta a Inglaterra já que a universidade em Escócia é de graça e em Gales o Governo porá a diferença - Governo que vem de reforçar o estatus do idioma galês-. Logo dirám-nos que o Reino de Espanha é um dos estados mais descentralizados do mundo mundial, como gostava de dizer o Manolito Gafotas.

Esta suba de taxas provocará umha elitizaçom do ensino à vez que impulsará umha nova servidume por dívidas. Os créditos - que se vendem como "bolsas"- estavam a 1'5% de juro de meia e passam a 3% a devolver após ter umha nómina de 2.000€/mês (os ordenados logicamente som mais elevados lá do que na Galiza). Aqui, por enquanto, som múltiplos os estudantes que sempre recebiam bolsas e que vírom diminuídas as quantias ou a bolsa denegada - por sua vez eliminárom-se bolsas doutro tipo e administraçons- com o conto da austeridade.

Afinal, ou antes de mais, a próxima greve do estudantado galego deveria ser um clamor para impedir que sejamos das últimas geraçons que ainda estudam numha universidade merecente do qualificativo de "pública", ou seja, o definitivo assalto organizado contra a educaçom. Porém, convocada em quinta-feira, é provável que, infelizmente, a greve na USC nom passe de mais umha ponte para muitos  ou umhas férias de Natal por adiantado e veremos os estudantes que, ao cabo, estarám na praça no Toral às 12 a.m. E se a cousa fosse a mais? Obrigariam-nos os militares com o estado de sítio a estudar? Carregariam com cavalos e unidades montadas como em Inglaterra? "Ocuparia" o estudantado a catedral, a cidade da cultura, a reitoria, etc. por umhas horas como os nossos homólogos italianos? Esperemos que nom seja mais umha "folga", que nom greve, como as convocadas em anos passados, dessas em que a moa nom se move porque o rio nom trai auga.