Palavras novas e velhas

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

O progresso, a ética e a moral


«In principio erat verbum», Evangelho de Sam Joám.

Houvo um tempo em que o progresso ia da mao da razom e esse mesmo progresso de Darwin, Pascal, Newton e companhia trouxo a luz e afogou as tebras do obscurantismo e o fanatismo do integrismo religioso, de dogmas comenenciudos e autos de fé. Nom viria mal, já que logo, que neste mundo de progresso eurocéntrico, de narcisismo esquizofrénico, viraramos os olhos para a Antigüidade, como melhor forma de topar terra firme numha sociedade guiada sobre o baleiro polo único deus-dinheiro e o seu catecismo do livre mercado.
As desigualdades mundiais e os genocídios auspiciados e financiados por Ocidente para o espólio dos recursos naturais do Oriente ponhem em dúvida aquilo que expunha Aristóteles na sua Política (livro I, c.l.): o home é um animal racional, ou sendo mais literais, «só o home, entre os animais, possui a palavra». É é que λογος, significava nom apenas palavra (lat. VERBUM), mas tamém razom; o μυθος, o mitológico, face o λογος, o racional que achegava a filosofia grega. Daquela, para os romanos ζώον λογικός deu pé à expressom ANIMALE RATIONALE.
Porém, a racionalidade humana deve limitar-se segundo Aristóteles polo bem da comunidade e de aí a asseveraçom recolhida pouco denantes no mentor de Alexandre Magno: «o home é um animal político». A afirmaçom aristotélica nom se limita apenas ao que hoje entendemos por político, palavra bastante doestada no imaginário popular como conseqüência da propaganda franquista que demonizara todo o político e social. Assí, Ό ́άνθρωπος φυσει πολιτικόν ζώον deveria traduzir-se melhor como «o home é por natureza um animal social», dimensom humana que fai referência à necessidade de agir dentro dumha comunidade para melhorar as condiçons gerais de vida dos membros da comunidade, facto que requere a acçom social organizada que na sociedade do TER e nom do SER se esqueceu entre a apatia e a renúncia a umha ética de esquerdas onde nom só e permitido, mas tamém exigido o ser pessoa.
Esta reflexom vem a conto agora que certas correntes políticas negam a existência dos direitos colectivos que temos como povo diferenciado, com o galho de aniquilar qualquer resistência nacional, tentando erradicar o nosso mais importante traço identitário: a língua.
Em 1983 aprovou-se a Lei de Normalizaçom Lingüística que iniciou um consenso, tam só teórico, sobre a língua que agora o PP, umha vez fora do poder, abandona com o único objectivo de nom perder “cancha” eleitoral perante a extrema direita representada por UpyD e a neofascista Rosa Díez; ao pam, pam e ao vinho, vinho. Assí, da auto-xenreira e do franquismo sociológico nasce Galicia Bilingüe, organizaçom chefeada por funcionários molestes por terem que apreender a língua do seu país, e o Manifiesto por la lengua común onde se sintetiza a bárbara, xenófoba e retrógrada demagogia da ultra direita espanholista sob o disfarce dos direitos individuais e negando os colectivos, como se um pudesse solicitar em Salamanca ou em Sevilha receber aulas em galego, ou como se os operários ficassem com os seus direitos garantidos sem acçom sindical. Sejamos sérios, o único que se agocha na política lingüística de UpyD e de sectores do PP (do PSOE tamém, embora guardem as formas) é o extermínio de todo quanto nom se chame castelhano, até convertê-lo efectivamente em espanhol: a única língua do Estado. Eis o separatismo do ranço nacionalismo castiço.
Após quase trinta anos de política lingüística, fanada pola tolearia da cooficialidade, devemos reconhecer tam só alguns avanços lenes que, em modo algum, se manteriam de produzir-se umha involuçom. Cumpre reconhecer, portanto, certos avanços ainda que tam só seja em comparança com o acontecido nos territórios da Galiza irredenta: o Berzo, a Sanábria e o Eo-Návia.
A língua é o veículo social com o que nos comunicamos, o que nos permite ser num conjunto e interactuar com o meio e a massa social que nos rodeia. Entom, as línguas cumprem funçons sociais. O espanhol cumpre-as nos territórios da maior parte da Península, por isso é a indiscutida “língua nacional” (realmente língua estatal) acabando quase com o aragonês, a língua románica mais ameaçada de Europa; o astur-llionês e o extremenhu. Aliás, constringe e pom em risco a sobrevivência a meio prazo do catalám, o eúskara e o galego-português na Galiza.
No entanto, esta língua, que baseia a sua ideologia no Imperialismo e a invençom do monolingüismo[1], sofre ameaças bem mais graves noutros pontos do globo do que na Península, factos que os defensores da «lengua de Cervantes», como a eles lhes gosta dizer - com a predilecçom polo mito dos impérios vidos a menos-, semelham “esquecer”. Em Porto Rico e em Filipinas o castelhano passou de língua dominante a língua dominada e está sendo desprazada progressivamente polo inglês. Em Filipinas já quase nom o falam mais do que um feixe de velhos, enquanto a mocidade emprega a língua nacional, o tagalo, ou o inglês polo neocolonialismo ianque. Este estatus de inferioridade é extensível aos EUA onde mesmo é desprezado como o foi o galego, qualificado nom hai tanto como «dialecto» ou «jeringonza horrenda», quando é a língua habitual de por volta de duzentos milhons de pessoas. Como língua B, a nossa fala desde o século XV sofreu umha assimilaçom continuada, especialmente virulenta no século XX pola escolarizaçom universal, a ideologia imperialista do fascismo franquista – ainda viva hoje- e os mal chamados meios de massas (meios de controlo de massas diria eu).
Na tam gabada Constituiçom de 1978 reside esse «patrioterismo cañí» pois, enquanto conhecer o castelhano é um direito e um dever as «otras lenguas» som apenas um direito que nem sempre se cumpre, como bem sabemos. Na Galiza todos os planos normalizadores pairidos por umha ou outra admistraçom resultárom ser mera impostura e papéis molhados. A propaganda do «bilingüismo harmónico» e o 50% resultou ser um insulto à inteligência. O bilingüismo social nom existe; em nengum país do mundo se conseguiu nunca um equilíbrio semelhante e sempre haverá umha língua A e umha língua B e, entom, conflito lingüístico. De facto, a história di-nos que é umha quimera a sobrevivência do galego com a actual dependência política e lingüística.
Destarte, para virar as tornas som necessárias medidas valentes, decididas e paliativas como as que despraçárom ao inglês no Quebeque, mas isto implicou reconhecer que se aspirava à oficialidade única ou principal do francês, até alcançar um estatus social A, que nom exclui a aprendizage individual de qualquer umha da línguas do mundo, nomeadamente do inglês e das peninsulares (junto ao do latim que deveria ser a língua universal, desde umha perspectiva ecolingüista por ser umha língua morta e nom o inglês).
Isto é cento por cento aplicável para qualquer política lingüística a sério na Galiza. Ou somos conscientes dos nossos direitos colectivos e históricos como povo ou rem bom se pode aguardar para o galego, já que a situaçom actual contribui energicamente ao fortalecimento do espanhol posto que os alicerces da glotofaxia ou canibalismo lingüístico através dum racismo lingüístico que alimenta a auto-xenreira de moitas galegas e moitos galegos.
A necessidade dumha outra política lingüística fica de manifesto em qualquer cidade da Galiza. Enquanto em Euzkadi a língua nacional recuperou terreio, sobretodo polo comproisso social da mocidade, e em Catalunya quase se normalizou , na Galiza a mocidade vira-lhe as cosas pola transmissom de velhos preconceitos que parte da sociedade, os meia e os maos «escolantes», que nem professores merecem chamar-se, absorvêrom do espanholismo mais radical, herdado de quarenta anos de fascismo impenitente.
Os galegos podemos chegar a ser o que queiramos, sempre e quando nom nos esqueçamos de quem fomos e, sobretodo, do que ainda somos. Terra a nossa!
[1] O monolingüismo nom existe em praticamente nengum território como bem assinala Henrique Monteagudo. Em Madrid hai falantes de árabe, chinês, etc. e nom apenas de castelhano. Na América do Sul contam-se por milhons as pessoas que nunca ou moi excepcionalmente empregam o castelhano e alguns quase nem entendem o espanhol rachando o mito da língua universal que já tem denunciado Kamen como simples chauvinismo encardinado no que o Imperialismo espanholista chama pomposamente “la hispanidad”.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Natal, lume e neve; pedra e povo.

NATAL 25/12/08




«Fijo en el recuerdo,

vi como defiendes,

corazón ausente

del sol, tiempo eterno»,

“Los tres tiempos” em Cántico de Jorge Guillén




A rua deixava-se despir por um feixe de luz

que punha engrávida a revolta da praça

por onde caminham vultos coas maos nos petos

petrificados polo gélido bafo do oco.

No céu choutavam as estrelas

e do seu manto azul caia,

sem piedade, a giada que aterecia

a todo um país: o país das maravilhas;

cheio de luzes de Natal, cheio de vitrinas

cheio de parabéns, cheio de nada e de vazio.



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Salmo 2009 6/1/09

«Quomodo cantabimus canticum Domini/ in terra aliena?», Salmo 136 da Vulgata.

No princípio era a palavra.

E a palavra fixo-se carne,

carne branca, carne preta;

e os povos habitárom a terra.

No princípio era a palavra.

E a palavra fixo-se pedra,

verba escrava de papéis numerados;

e os povos caírom sob os estados.

No princípio era a palavra.

E a palavra fixo-se guerra,

arma branca, morte preta;

e os estados sujárom o planeta.

«Sobo-los rios que vão

por Babilónia me achei,

onde sentado chorei

as lembranças de Sião

e quanto nela passei»[1].

No princípio era a inocência.

E a inocência fixo-se ódio.

E o ódio passou, coma em Egipto,

de geraçom para geraçom:

Israel! Israel!

Para onde vam teus filhos Iavhé?!



[1] Primeira estrofe da versom do Salmo de David para Jeremias (salmo 136) feita por Luís Vaz de Camões e conhecido polo primeiro verso. Para além de jogar coa seu próprio desterro na Índia (através da epopeia do povo judeu em Mesopotámia) emprega tantos versos coma dias do ano e tantas estrofes como meses, completando assí um simbolismo vital inserido numha composiçom grave e de tom moral e filosófico, único exemplo deste calibre nas suas redondilhas de tom, polo geral, amoroso ou jocoso.


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Estrada sem volta

Choutam as estrelas co brilho da geada

e incomodam-se pneumáticos co rechouchio

gélido da sangue coalhada em formol de adeuses.

Assombrado tamiz que congela as paixons

e apreixoa aos paxarinhos inocentes

que caim sob a força de gigantes com arumes!

Nomes. Dai-me nomes que pidam adjectivos

lenes e suaves, formosos nos beiços telúricos

de sonhos enlamados nas augas sólidas do mais alá.

Dai-me as velhas palavras, simples, despidas

como as oucas que alouminham troitas tristes

no crepitar morno das correntes cinzentas.

Para onde caminharám as lembranças,

onde irám de dor tingida as antigas horas?

Vam tirando por vieiros sujos e esquecidos

obscuros e velhos recordos

que cospem fel na cima dos carriços

dum lobo eterno e gris...

Sempre, sempre entre a estadeia

talvez e só talvez às cinco da manhá.


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Circunvoluçom progressista

«Confiemos nas vindouras geraçons

di quem já nom acredita na sua», Sechu Sende.

Canto vida, canto morte,

quase fina a palavra

entre finos beiços de mel.

A eixada chama-se já computador.

A eira pátio.

Os sonhos metal;

o amor obscuras notas.

Mas, canto vida, canto morte,

canto a perda da minha sorte

que se agocha e lisca

entre as dedas de deus

em necrose permanente desde Nietzsche.

Ao carro chamam-lhe «coche».

Ao proletário contribuinte.

Ao engano notícia;

à naçom comunidade.