Palavras novas e velhas

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A greve dos desempregados


O 29 de setembro será um bom dia para faltar ao trabalho e em pacífico desfile de duas horas rachar com os nossos farrapos e queixar-nos na má sorte de pertencer à classe trabalhadora nestes tempos de regressom. De greve geral indefinida ainda nom ouvimos nada, nem ouviremos.

O sindicalismo após ficar anos e anos na comodície de viver engarçado na superestrutura do Estado decata-se agora que ele mesmo pode ter praticado a sua própria eutanásia. A Eurolándia, com a esquerda de férias e no poço da melancolia vê como se esfarelam umha após outra as organizaçons operárias e ainda planeiam no ar as ameaças de pôr ponto e final ao direito à greve e ao sindicalismo, como nos EUA , espelho de parvos, se tem feito há assaz tempo. Nom interessa tomar nota da espartana e muito exemplar resistência das forças operárias gregas, com os anarquistas em cabeça. Nom se fixo nem se vai fazer pedagogia política e revolucionária, para que se agora somos consumidores por cima de trabalhadores e súbditos por cima de cidadaos?

Ainda mais engraçado é ver estes dias como os que clamam polo despedimento livre, os que sem empalago criárom 5 milhons de desesperados parados para serem força de trabalho na reserva e assim rebaixar as condiçons laborais dos empregados, os que te botam quando colhes a baixa laboral; botando as maos à cabeça porque nesta greve nom se respeita o direito ao trabalho. Está bem que a patronal defenda o direito constitucional ao trabalho ainda que seja por um dia e para logo seguir deixando sem fogar ou sem vida, através dumha hipoteca, aos trabalhadores de toda a parte durante 364 dias.

É dum patetismo da antiga tragédia grega ver a um governo muito preocupado por chamar-lhe "serviços mínimos" a máxima quantidade de serviços possível para rotular a greve geral do 29 como um fracaso, para, de mútuo acordo com a direita neofascista, converter-se nos social-liberais que podam dizer "en el día de hoy, cautiva y desarmada la clase trabajadora, ha alcanzado la bancocracia sus últimos objectivos lucrativos. Wall Street, 29 de setiembre de 2010". Os mercados ordenam, os cidadaos consomem umha ou outra cor política enquanto levam já perdido em poder aquisitivo o ordenado equivalente a mais dum mês de trabalho ao longo da primeira década do século XXI.

Na instáncia ideológica, ou cultural, o socialismo deve centrar os seus esforços na ancoragem real dos conceitos: como é que os homes desigualmente classificados pola sociedade aceitam a dominaçom política e a exploraçom económica à que estám submetidos? Como o aparecimento da propriedade privada aparece o estado e as classes sociais que, para Lenine, eram "grandes grupos de seres humanos que se diferenciam entre si polo lugar que ocupam num sistema de produçom social historicamente determinado". Aí é onde aparecem as relaçons antagónicas, quer dizer, os interesses incompatíveis que geram estas classes em toda a história das sociedades. Haverá que voltar ao básico...

O discurso social comum, onde a hegemonia é total e absoluta da oligarquia dominante - umha hegemonia inédita em décadas por nom dizer inédita apenas-, modula o horizonte de expectativas social, o de cada indivíduo-consumidor mesmo, e muitas vezes esta "consenso ultraliberal", este grandiloqüênte pensamento único neofascista tem estranhos companheiros de cama. Aparelhos ideológicos especializados que operam na sua instáncia, como partidos políticos e sindicatos, nom reagem contra essa prissom, mas a contrário elaboram e difundem práticas especializadas e representaçons que atentam contra as classes a quem supostamente representam.

Esta hegemonia alia-se à dominaçom exercida polo Estado, totalmente entregue aos "mercados", ao fascismo financeiro, na certeira definiçom de Boaventura de Sousa Santos. Neste par consentimento / obriga exprime-se um macabro equilíbrio que lisca totalmente da necessária regulaçom que nele deve operar a sociedade civil. A luita de classes é objectivamente mais crua do que em décadas, a consciencia mais fraca do que em séculos. O descrédito das pessoas políticas, o recuo da audiência sindicais, a versatibilidade das opinions públicas vam em aumento perante a falta de sindicatos e partidos combativos.

Assim em Eurolándia todo pode seguir "progressando". O liberalismo extremo da UE condenou-na e condenará a bater umha e outra vez o recorde mundial do desemprego do centro capitalista. A sua vulnerabilidade provoca umha anemia social profunda e as reacçons socias canalizam-se pola via do populismo xenófobo e fascizante, tal e como os ciganos, "os judeus de arestora" nos demonstram enquanto segue sem nascer - afora de Die Linke ou o Bloco de Esquerdas- umha esquerda social combativa, a IV esquerda, que desaferroa-lhe os operários e a sua mente, que conecte com a sociedade civil, com a esquerda social e que evite a recente advertência de Beiras de que nom estamos livres de sermos parte do denominado terceiro mundo. Por enquanto, em Melilha, em México, em Paris, em Malta ghettos e muros som erguidos polo novo fascismo social, o totalitarismo capitalista, a quem só estorvava o pérfido muro de Berlim... que lho perguntem aos camponeses russos ou aos trabalhadores letons e estónios se melhorárom ou piorárom com o sacrossanto "livre mercado".

Enquanto os sindicatos vigoram no Brasil, na Coreia do Sul, na China ou na Índia em Eurolándia esfarêlam-se porque nem Marx pudo sonhar para os operários umha vivenda, um automóvel e tantos outros bens duráveis... Mas após o espelhismo dos trinta dourados, semelha que todo volve ao seu rego e que a teoria dos ciclos longos de Kondradiev é mais acertada do que alguns economistas-opinólogos supunham com o seu olfato mustélido.

O sindicalismo actual e a esquerda vive num recuo defenssivo que nom vale, efectivamente, mais do que para recuar. É tempo de avançar, é necessária umha nova esquerda e um novo sindicalismo. A greve concebeu-se como o melhor modo de privar de mais valia, e portanto de lucro, à burguesia para rematar sendo umha marcha de duas horas com bonitas bandeiras e cánticos quase já religiosos. Longe ficam já greves como a dos trabalhadores da construçom da Crunha que espoliados pola CNT ressistírom durante seis meses demandando a jornada laboral de 6 horas e aumentos salariais. Longe a adaptaçom da esquerda a realidade social e histórica em que se insire porque leva as lentes emprestadas dos poderosos. Ninguém se decatou de que esta ou é a greve dos desempregados ou nom será. Num Estado espanhol com desemprego crónico é tam importante chegar à consciência dos trabalhadores como a dos desempregados.

O 29 de setembro nom deixarei de assistir a esta greve. Jogo-me muito aos meus 24 anos e jogam-se muitos as vindouras geraçons. Do velfarismo ao shanganismo nom há tanta distáncia real como a que os mapas nos querem fazer ver. Isso sim, fique às claras que o tempo da greve geral indefinida já há tempo que o marcara o relógio da razom e da história... aguardemos que as agulhas nom estejam já aferrolhoadas, porque nom há mal que cem anos dure... agás o capitalismo e a sua natureza depredadora. Justificar completamente

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